INDICA O PRESIDENTE DA AFIA, TOMÁS MOREIRA, EM ENTREVISTA
in Vida Económica, por Aquiles Pinto, 03-02-2017

A indústria portuguesa de
componentes para a indústria
automóvel tem como objetivo
para 2017 voltar a bater recordes
de exportações, a exemplo do
que tem acontecido nos últimos
anos. “Espera-se que a indústria
mantenha esta tendência de
subida”, indica, em entrevista à
“Vida Económica”, o presidente
da Associação de Fabricantes
para a Indústria Automóvel
(AFIA), Tomás Moreira. “As
estimativas da AFIA apontam
para um volume de negócios
de nove mil milhões de euros
em 2016, um novo recorde
em termos absolutos, com um
crescimento de 7% face a 2015.
As exportações subiram aos 7,6
mil milhões de euros, 8% mais
do que em 2015”, explica o
presidente da AFIA.
Vida Económica – A indústria nacional
de componentes para a indústria automóvel
bate recordes de produção e exportação
quase todos os anos. O que justifica? Tomás Moreira – O aumento da produção
e da exportação pode ser explicado por:
primeiro, o aumento continuado da produção
de automóveis na Europa, principal destino
dos componentes portugueses. Quando
se produzem mais carros, o impacto sobre
a indústria de componentes é automático e
imediato; segundo, a competitividade e qualidade
das empresas portuguesas, que lhes
tem permitido ganhar quota de mercado; e
terceiro a implantação de novos fornecedores
de componentes em Portugal. As estimativas
da AFIA apontam para um volume de negócios
de nove mil milhões de euros em 2016,
um novo recorde em termos absolutos, com
um crescimento de 7% face a 2015. As exportações
subiram aos 7,6 mil milhões de
euros, 8% mais do que em 2015.
VE – Em 2017 vai voltar a haver bom
desempenho? TM – Para o corrente ano de 2017 espera-
-se que a indústria mantenha esta tendência
de subida.
VE – Qual a importância das fábricas
nacionais – em particular das duas maiores,
Autoeuropa e PSA Mangualde – para
a indústria nacional de componentes? TM – A indústria portuguesa de componentes
é essencialmente exportadora, as vendas
ao mercado nacional representam apenas
15% da atividade das empresas. A maioria
das empresas não está, intrinsecamente, dependente
das linhas de montagem automóvel
implantadas em Portugal, embora elas se
constituam sempre como clientes estratégicos.
VE – Essa importância irá manter-se
ou pretendem continuar a diversificar os
mercados de destino? TM – O volume das exportações mostra
a competitividade e as competências técnicas
desta indústria, como tal as empresas da
indústria de componentes automóveis estão
aptas para concorrer aos novos modelos que
venham a ser lançadas pelos construtores
automóveis instalados em Portugal. Nesse
sentido, é expectável que a incorporação nacional
aumente. Aliando a este efeito o facto
de estar previsto um significativo crescimento
da produção de automóveis em Portugal
nos próximos anos devido ao lançamento de
novos modelos por parte dos dois principais
construtores presentes no nosso país, as vendas
para o mercado interno irão seguramente
crescer duma forma sensível.
VE – Por mercados de exportação,
quais os mais importantes? TM – Espanha, Alemanha, França e Reino
Unido (por esta ordem de importância)
no seu conjunto representam mais de 70%
das exportações de componentes.
VE – Espanha, e a região da Galiza,
bem perto da fronteira, têm muita indústria
automóvel. Qual a importância? TM – Espanha é o nosso principal mercado,
com mais de um quarto das exportações
(26%) a serem canalizadas para o país
vizinho. Sem dúvida que Galiza em muito
contribui para esta importância. Em 2016,
a PSA Vigo fabricou praticamente três vezes
mais (424 mil veículos) do que os quatro
construtores em Portugal juntos (143 mil
veículos).
VE – A localização geográfica de Portugal
é um desafio em termos logísticos
para as empresas produtoras de componentes? TM – Sem dúvida que os custos logísticos
são uma dificuldade adicional à competitividade
das empresas, quando comparados com
os países da Europa Central e do Leste, que
estão muito mais próximos da Alemanha
(maior construtor europeu) e França. Todavia,
a significativa dimensão do mercado ibérico,
onde se produzem mais de três milhões
de veículos por ano (Espanha é o segundo
maior produtor europeu de automóveis),
permite às empresas portuguesas acederem a
um importante mercado regional com vantagens
logísticas.
VE – Quais os grandes desafios da indústria
portuguesa de componentes para
automóveis? TM – A deslocalização da produção de
viaturas para o Leste Europeu e para a China
e a consequente deslocalização da fabricação
dos componentes associados têm constituído
um desafio sério às nossas exportações e
à captação de investimento estrangeiro na
indústria de componentes. Exportando o
grosso da sua produção para mercados totalmente
abertos e globalizados e concorrendo
livremente com todos os outros países num
contexto de enorme competitividade de preços,
todas as questões ligadas a custos se revestem
de extrema relevância. A longo prazo,
há que considerar como desafios para o setor
as alternativas para a mobilidade e as pressões
ambientais contra o uso individual do transporte
rodoviário, o que provocará alterações
profundas ao modelo de negócio conforme o
conhecemos.
VE – Os custos e a qualidade do fornecimento
da energia tem melhorado? TM – O crescente custo da energia elétrica
e a ocasional má qualidade do seu abastecimento
têm prejudicado a competitividade
das empresas.
VE – A legislação laboral agrada ao
setor? TM – O atual quadro legal português ainda
não permite às empresas de uma forma
suficientemente expedita, desburocratizada
e sem custos extra adaptarem a laboração às
variações de curto prazo do fluxo de encomendas,
ao contrário do que acontece noutros
países. Apesar de Portugal ter os custos
salariais mais baixos da Europa Ocidental,
não se pode ignorar que competimos diretamente
contra países com custos de trabalho
muito inferiores, nomeadamente Marrocos.
Uma excessiva inflação do custo unitário do
trabalho, assim como qualquer retrocesso
na flexibilidade laboral, representariam um
agravamento dos fatores de competitividade
da economia portuguesa, que iria beneficiar
diretamente os países nossos concorrentes
e prejudicar as nossas empresas, levando à
perda de encomendas, redução de postos de
trabalho e quebra nos investimentos.
VE – Em abril de 2016, AFIA e Associação
Automóvel de Portugal (ACAP)
uniram-se para criar a Mobinov. Já é possível
fazer um balanço da iniciativa? TM – A AFIA e a ACAP foram as principais
promotoras da criação da MOBINOV
– Associação do Cluster Automóvel, que será
a plataforma agregadora de conhecimento e
competências no âmbito da indústria automóvel
em Portugal. São associados da MOBINOV
os construtores de automóveis, os fabricantes
de componentes e ainda uma série de
Entidades do Sistema Científico e Tecnológico
Nacional, que se unem com o objetivo declarado
de promover uma maior cooperação
entre si, ultrapassando barreiras do passado
(construtores “versus” fornecedores, indústria
“versus” universidades) e assim criar condições
para a obtenção de níveis de inovação e desenvolvimento
tecnológico alargados, potenciando
a competitividade internacional da indústria
automóvel portuguesa. Apesar de o início
de atividade efetiva da nova associação aguardar
pelo reconhecimento oficial por parte do
Ministério da Economia/IAPMEI, começam
já a sentir-se frutos positivos da aproximação
entre as diversas instituições do setor.
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